sexta-feira, janeiro 14, 2005
CLARO COMO ÁGUA: obsessões.
Portugal produz, anualmente, cerca de 254 mil toneladas de resíduos industriais perigosos (RIP) de vários tipos, das quais grande parte não é sujeita a qualquer tratamento, indo-se juntar a alguns milhões de toneladas produzidas em anos anteriores e que têm vindo a ser depositadas, ao longo do tempo e sem controlo adequado, em vários pontos do País, contaminando os solos e as águas subterrâneas e constituindo um verdadeiro atentado ao ambiente e à saúde pública que empobrece e envergonha o País.
Estamos, portanto, perante um problema da maior importância que requer solução urgente – seja no que se refere às novas quantidades de RIP diariamente produzidas, seja no que se refere ao passivo ambiental - com base nas melhores tecnologias disponíveis, testadas e internacionalmente reconhecidas como adequadas.
Estas tecnologias são diversas, consoante as características dos diferentes tipos de RIP, havendo, em muitos casos, mais do que uma tecnologia aplicável ao tratamento de um dado tipo de resíduos.
Como tem sido exaustivamente demonstrado com o apoio de estudos e pareceres técnico-científicos idóneos e independentes e pela prática vigente nos países mais desenvolvidos e com políticas ambientais mais evoluídas, como a Suécia, Alemanha, França, EUA, etc., para uma parte significativa destes RIP – cerca de 80 mil toneladas por ano, ou seja, mais de 30% do total de RIP anualmente produzidos, a que acrescem as que integram o actual passivo ambiental - a tecnologia que mais rápida, eficaz e eficientemente, e sem problemas significativos para o ambiente e para a saúde pública, pode resolver o problema é a da valorização energética destes resíduos através da sua co-incineração em fornos de cimenteiras. Tal solução tem a grande vantagem de estar mais imediatamente disponível e de não impedir o recurso futuro a outras soluções que o desenvolvimento científico e tecnológico venha a aconselhar como ainda mais adequadas, à medida que tais soluções estejam devidamente testadas e operacionalmente disponíveis.
Constituiu, por isso, uma grande incompetência e leviandade política o abandono no início de 2002, por parte do Governo PPD/PSD-CDS/PP, da co-incineração para esta parte dos RIP, abandono esse motivado, fundamentalmente, por razões de oportunismo político-partidário e sem que o Governo tivesse, na altura, qualquer solução alternativa válida para implementar.
Os resultados estão à vista. Passados quase três anos, e contrariamente ao que havia prometido, o Governo não conseguiu pôr a funcionar qualquer solução alternativa que se revelasse mais eficaz e eficiente do que a co-incineração, aumentando assim o já elevado passivo ambiental existente e continuando sem fim à vista para resolver o problema.
Para escamotear este enorme fracasso político que está a causar graves prejuízos ao País, o Governo apresentou, no início de 2003, uma solução baseada na construção dos CIRVER-Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos cujo desenvolvimento se tem vindo penosamente a arrastar e que, na melhor das hipóteses, não estarão operacionais antes de 2007. Acresce que, no que se refere em particular aos RIP susceptíveis de valorização energética através da co-incineração, a solução do Governo se baseia, em grande medida, em tecnologias ainda pouco testadas e com resultados, custos e consequências ainda não devidamente esclarecidos. Ainda assim, os defensores da solução do Governo reconhecem que para uma parte destes resíduos só a incineração é o tratamento adequado, mas a obsessão contra a co-incineração é tal que, mesmo neste caso, defendem a exportação desses resíduos, para serem incinerados ou co-incinerados noutros países, como se esta solução fosse boa para esses países mas má para Portugal, traduzindo assim a inconsistência, a má consciência e o oportunismo da sua política ambiental.
Com o previsível regresso do PS à governação do País, agora liderada por José Sócrates que se bateu pela co-incineração com grande convicção e empenho é, pois, natural que esta solução venha, de novo, a ser encarada e que a obsessão contra a co-incineração seja substituída pela obsessão a favor da resolução urgente do problema dos RIP no País.
Mário Lino
Consultor e ex-Presidente do Grupo Águas de Portugal (AdP).
Este artigo foi também publicado no Diário Económico do passado dia 30 de Dezembro.
Estamos, portanto, perante um problema da maior importância que requer solução urgente – seja no que se refere às novas quantidades de RIP diariamente produzidas, seja no que se refere ao passivo ambiental - com base nas melhores tecnologias disponíveis, testadas e internacionalmente reconhecidas como adequadas.
Estas tecnologias são diversas, consoante as características dos diferentes tipos de RIP, havendo, em muitos casos, mais do que uma tecnologia aplicável ao tratamento de um dado tipo de resíduos.
Como tem sido exaustivamente demonstrado com o apoio de estudos e pareceres técnico-científicos idóneos e independentes e pela prática vigente nos países mais desenvolvidos e com políticas ambientais mais evoluídas, como a Suécia, Alemanha, França, EUA, etc., para uma parte significativa destes RIP – cerca de 80 mil toneladas por ano, ou seja, mais de 30% do total de RIP anualmente produzidos, a que acrescem as que integram o actual passivo ambiental - a tecnologia que mais rápida, eficaz e eficientemente, e sem problemas significativos para o ambiente e para a saúde pública, pode resolver o problema é a da valorização energética destes resíduos através da sua co-incineração em fornos de cimenteiras. Tal solução tem a grande vantagem de estar mais imediatamente disponível e de não impedir o recurso futuro a outras soluções que o desenvolvimento científico e tecnológico venha a aconselhar como ainda mais adequadas, à medida que tais soluções estejam devidamente testadas e operacionalmente disponíveis.
Constituiu, por isso, uma grande incompetência e leviandade política o abandono no início de 2002, por parte do Governo PPD/PSD-CDS/PP, da co-incineração para esta parte dos RIP, abandono esse motivado, fundamentalmente, por razões de oportunismo político-partidário e sem que o Governo tivesse, na altura, qualquer solução alternativa válida para implementar.
Os resultados estão à vista. Passados quase três anos, e contrariamente ao que havia prometido, o Governo não conseguiu pôr a funcionar qualquer solução alternativa que se revelasse mais eficaz e eficiente do que a co-incineração, aumentando assim o já elevado passivo ambiental existente e continuando sem fim à vista para resolver o problema.
Para escamotear este enorme fracasso político que está a causar graves prejuízos ao País, o Governo apresentou, no início de 2003, uma solução baseada na construção dos CIRVER-Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos cujo desenvolvimento se tem vindo penosamente a arrastar e que, na melhor das hipóteses, não estarão operacionais antes de 2007. Acresce que, no que se refere em particular aos RIP susceptíveis de valorização energética através da co-incineração, a solução do Governo se baseia, em grande medida, em tecnologias ainda pouco testadas e com resultados, custos e consequências ainda não devidamente esclarecidos. Ainda assim, os defensores da solução do Governo reconhecem que para uma parte destes resíduos só a incineração é o tratamento adequado, mas a obsessão contra a co-incineração é tal que, mesmo neste caso, defendem a exportação desses resíduos, para serem incinerados ou co-incinerados noutros países, como se esta solução fosse boa para esses países mas má para Portugal, traduzindo assim a inconsistência, a má consciência e o oportunismo da sua política ambiental.
Com o previsível regresso do PS à governação do País, agora liderada por José Sócrates que se bateu pela co-incineração com grande convicção e empenho é, pois, natural que esta solução venha, de novo, a ser encarada e que a obsessão contra a co-incineração seja substituída pela obsessão a favor da resolução urgente do problema dos RIP no País.
Mário Lino
Consultor e ex-Presidente do Grupo Águas de Portugal (AdP).
Este artigo foi também publicado no Diário Económico do passado dia 30 de Dezembro.